segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

TIPOS DE PASTOS DE ANGOLA

OBS: Comunicação apresentada ao I Congresso de Zootecnia Tropical. Dez 1989. Lisboa, Portugal.


INTRODUÇÃO

A exploração das terras de vegetação natural pelas populações humanas é fundamental e, as formas pelas quais o mesmo ecossistema é usado, varia consideravelmente de região para região e de país para país.
A influência humana é muito grande nas áreas de veld (estepe da África do Sul) pelo desbaste de árvores (abrindo clareiras para fins agrícolas), pela acção do fogo e pelo pisoteio dos ruminantes, o que contribui para a instabilidade das populações devido às profundas modificações desfavoráveis da vegetação (regressão da maior parte das espécies palatáveis, crescimento de arbustos e erosão). Segundo GALOUX (1965), devido à intervenção humana, cerca de dois terços das florestas de África desapareceram nos últimos séculos e, segundo RENÉ DUMONT (1988), o Senegal perde cerca de 75 000 hectares de floresta por ano.
No continente Africano têm sido elaborados estudos gerais sobre a vegetação mas, estes estudos, não são detalhados para cada país e para cada região ecológica.
Alguns estudos foram elaborados em Angola, antes da independência, sobre as pastagens que tiveram objectivos essencialmente fitogeográficos e florísticos e, poucos, tiveram uma orientação no sentido zootécnico. Considerando a importância do reconhecimento das regiões pastoris, LIMA PEREIRA, em 1966, propôs à FAO a criação duma “Comissão Internacional de Pastagens”, em que o reconhecimento das regiões pastoris tivesse uma orientação essencialmente zootécnica, com indicações das espécies forrageiras (incluindo as arbustivas de interesse zootécnico).

TIPOS DE PASTOS DE ANGOLA
As características das pastagens de Angola permitem dividir o território nos três agrupamentos da classificação genérica Sul-Africana:
- Sour veld, High veld ou Pastos acres;
- Mixed veld, Middle veld ou Pastos mistos;
- Sweet veld, Low veld ou Pastos doces.
Estes tipos de pastos correspondem, com maior ou menor exactidão, à zona planáltica ou alta, subplanáltica ou zona média e zona média, respectivamente.
A zona de pastos acres ocorre em altitudes superiores a 1 000 metros, onde a pluviosidade varia entre 650 e 1500 mm. A cobertura graminosa é geralmente densa, podendo ser pastada intensamente e é economicamente possível a produção de forragens e pastagens cultivadas. Em condições normais, os pastos perdem a palatabilidade durante o período compreendido entre Maio e Outubro ou Novembro e só têm interesse para a alimentação do gado bovino num estado precoce do seu desenvolvimento. Com a maturação, as gramíneas atingem e ultrapassam níveis celulósicos de 40%. Em paralelo com a reduzida palatabilidade das gramíneas no tempo seco, nas zonas planálticas, segundo LIMA PEREIRA (1969), as espécies arbustivas e arbóreas de valor zootécnico são em pouco número e não mostram tendência para a propagação devido à acção anual das queimadas.
Nas regiões de pastos mistos que ocorrem nas altitudes até 1 000 metros e onde a precipitação oscila entre os 400 e 800 mm, há gramíneas que desde cedo se tornam impalatáveis, enquanto outras se mantêm palatáveis mesmo depois de atingirem a maturação. O pasto é mais denso e a capacidade por hectare é superior à dos pastos doces e pode-se fazer feno. Estas regiões são moderadamente ricas em espécies arbustivas e arbóreas que pouco contribuem para a nutrição do gado bovino; são necessários poucos alimentos suplementares para a estação seca, recomendando-se, no entanto, a utilização cuidadosa do pasto e, como segurança contra a seca, deve-se fazer feno e silagem.
Na zona de pastos doces que ocorrem em regiões de baixa altitude, quente e de pluviosidade inferior a 750 mm, há uma cobertura graminosa escassa, do tipo estepérica e de baixa capacidade bovina por hectare, sendo facilmente prejudicados por apascentação contínua durante a estação de crescimento e não há possibilidade para a produção generalizada de forragens. As pastagens correspondentes aos tipos fisionómicos de vegetação designados por estepe, têm um regular valor alimentar durante todo o ano, devido á maior digestibilidade das gramíneas e da existência de uma flora arbustiva e arbórea palatável. Segundo LIMA PEREIRA (1969), o grande número de leguminosas existentes com folhas de teores em proteína bruta superiores a 20% permite um bom estado de nutrição, sempre que o período de seca não seja excessivo, isto é, para esta zona, superior a 8 – 9 meses e com não menos de 200 mm de pluviosidade. O valor azotado das folhas dos arbustos é muito elevado e o seu teor em cálcio ultrapassa sempre as necessidades dos ruminantes, mesmo em crescimento regular; os valores em fósforo, embora mais baixos, parecem ser suficientes para os tipos de animais em exploração. Nas regiões litorais ao Sul e ao Norte do rio Kuanza, as formações são do tipo savana e, segundo SALBANY (1956), “são excelentes para a pecuária”.
É claro que estes tipos de pastos não estão rigorosamente diferenciados pelas isoietas isotérmicas ou pela carta de solos, porque todos estes factores no seu conjunto e em diferentes combinações, têm influência nos tipos de pastos existentes. Assim, é frequente encontrar manchas de pastos mistos nas zonas planálticas, como de pastos acres na região de pastos doces mas, de um modo geral, a diferenciação condiz mais com as características climáticas, principalmente com a pluviosidade total e a sua distribuição ao longo do ano do que qualquer outro factor.
RATTRAY (1960), considera a existência em Angola, das seguintes formações graminosas dominantes:
- R1 - Rhynchelytrum associado com savana;
- S2 - Setária associada com savana;
- H16 - Hyparrhenia associada com savana;
- H15 - Hyparrhenia associada com bosque;
- L2 - Loudetia associada com pradaria;
- L3 - Loudetia associada com bosque;
- A3 - Aristida em condições desérticas;
-A8 - Aristida associada com estepe;
- E8 - Eragrostis associada com savana.

Quanto à vegetação existente nas várias regiões do país, deverá consultar-se a Carta Fitogeográfica de Angola, de GOSSWEILER (1939) e a tese de Doutoramento de GRANDVAUX BARBOSA.
A capacidade de carga é um termo usado para exprimir o número de hectares necessários para manter uma cabeça normal, ou uma unidade animal (aproximadamente 450 Kg de peso vivo) durante um ano inteiro e sem provocar a degradação da pastagem. Este conceito é simples mas, é de difícil aplicação.
A capacidade de carga duma pastagem não é um elemento a obter por experimentação, para aplicar arbitrariamente a todas as explorações duma mesma unidade ecológica. Cada exploração, cada pastagem tem a sua carga pecuária óptima para determinada precipitação, carga que, para cada caso, o técnico indica ao criador, acompanhando nos seus efeitos, para rectificar, se necessário, a concepção inicial.
Os factores a serem tomados em conta na determinação da carga animal, podem ser resumidos em:
- factores relacionados com o animal;
- factores relacionados com a pastagem.
Assim, o ponto de equilíbrio de carga nas pastagens é aquele em que a utilização do campo permite uma boa produção animal, sem prejudicar a vegetação forrageira nela existente. Se o ponto de equilíbrio for ultrapassado, verificar-se-á não só a destruição lenta mas contínua da forrageiras, como o excesso de pisoteio levará ao aparecimento de arbustos não forrageiros e o crescimento livre permitir-lhes-á o rápido estabelecimento no terreno. Assim sendo, os animais são prejudicados no seu desenvolvimento e a recuperação das forrageiras será extremamente difícil. LIMA PEREIRA (1962) definiu que o maneio do gado com vista a conseguir-se uma racional utilização das pastagens naturais deverá, portanto, ser equacionado perante factores concretos de ordem climática, edáfica ou humana.
Segundo ALEXANDRINO PEREIRA (1981), nos campos de pastagem natural em Angola, estão calculadas as seguintes cargas pecuárias:
- 10 ha/bovino/ano, na zona de pastos doces;
- 6 ha/bovino/ano, na zona de pastos mistos;
- 2.5 a 4 ha/bovino/ano, na zona de pastos acres.
No entanto, não se deverá considerar estes valores como estáticos, porquanto, na determinação da carga animal há que ter em atenção uma série de factores, entre os quais citaremos alguns:
1º - Rendimento da pastagem que estará em dependência das espécies e variedade de gramíneas e leguminosas, da luta contra as ervas daninhas, da fertilização, da intensidade de exploração, da idade e potencial genético dos animais, etc. As práticas de maneio das plantas forrageiras devem ser determinadas em função das características morfológicas e fisiológicas das mesmas para assegurar altos rendimentos, persistência da forragem colhida e alta qualidade dos animais.
2º - Velocidade e capacidade de crescimento da pastagem que está em função dos desfolhamentos repetidos, do momento óptimo para o pastoreio directo ou corte mecânico, do tempo de repouso, do vigor da cada planta e sua precocidade, do porte alto ou baixo (rasteiro) da planta, sendo geralmente estas últimas mais resistentes ao pastoreio intenso.
3º - Consumo do animal que está dependente de numerosos factores, entre os quais citaremos os seguintes:
3.1 – factores relativos à planta: maturidade ou idade do rebrote; disponibilidade e densidade do pasto; conteúdo da matéria seca, proteína bruta e carbohidratos solúveis; digestibilidade da matéria seca; relação folha-caule; fertilização nitrogenada; famílias, espécies e variedades; palatabilidade, cheiro e sabor;
3.2 – factores relativos ao animal: actividade metabólica e estado fisiológico; raça e espécie animal; peso vivo, etc.;
3.3 – factores ambientais: estação do ano, temperatura e humidade do ar; precipitação;
3.4 – outros factores: concentração energética da ração e suplementos; consumo de água, etc.;

4º - Aproveitamento possível pois, o que nos interessa não é realmente a quantidade de pasto existente mas, a quantidade de pasto colhível, isto é, aquela que será colhida pelos animais no caso de rapagem média.

Considerando o que atrás foi citado, há a necessidade de se promoverem estudos com o objectivo de se obter um conhecimento mais profundo dos recursos forrageiros nas regiões tropicais. Estes estudos deveriam ser enquadrados por equipas multidisciplinares que levariam à resolução de algumas questões que impedem o actual desenvolvimento e plena utilização dos recursos forrageiros. Assim, seria necessário, segundo a UNESCO em Tropical Grazing Land Ecosystems de 1979, estabelecer o seguinte:
1º - A nomenclatura dos ecossistemas das terras de pastagem pois, os caracteres estruturais que são usados, tipos biológicos e morfológicos não permite que a vegetação seja descrita duma forma precisa;
2º - Métodos de estudo da vegetação – a variedade de métodos utilizados actualmente torna difícil a comparação dos resultados;
3º - Inventário sistemático das espécies forrageiras – pois desconhece-se actualmente: o valor alimentar da forragem; as flutuações sazonais da produção forrageira e as possibilidade de armazenamento; as perspectivas de regeneração natural e de plantação; os potenciais de crescimento, a resistência às condições ambientais, etc.
4º - Estudos sobre a distribuição geográfica das espécies e elaboração dos respectivos mapas;
5º - Estudos sobre a dinâmica das pastagens – há falta de dados precisos sobre a produção forrageira actal ou possível das espécies arborescentes por unidade de superfície e de tempo, pois ainda não existe uma silvicultura nem arboricultura forrageira;
6º - Publicação dos resultados – os resultados destas investigações permitiriam aos países, dentro do quadro de desenvolvimento dos territórios, combinar a produção forrageira com a criação e a conservação de reservas para os animais selvagens. Por outro lado, as árvores e arbustos kogariam um papel importante no estabelecimento de populações de abelhas, permitindo através da recolha do mel e da cera mais uma fonte de alimento e de rendimento, respectivamente.
Conhecendo-se a importância da economia pastoril e dos problemas que ela coloca, um dos objectivos fundamentais seria o de garantir e melhorar a utilização das pastagens, respeitando escrupulosamente as outras utilizações (madeira, lenha, carvão, etc.) e a função protectora da vegetação.
Todos os meios de garantir e aumentar os recursos alimentares, de rendimento e de segurança das populações dos países sub-desenvolvidos são benvindos.

BIBLIOGRAFIA
- DUMONT RENÉ – Em defesa de África, ACUSO – o diário de um agrónomo no Sahel em vias de destruição. Publicações Europa América, Lda. Sintra. Portugal. 1988: pag: 166;
- GALOUX, A. – Les ruptures d’équilibre de l’environnment humain. Travaux du Centre d’Ecologie general (Bruxelles), 38. 1965. p: 261-278;
- GOSSWEILER, J. – Carta Fitogeográfica de Angola. Ed. Do Governo de Angola. 1939;
- LIMA PEREIRA, J. – Introdução ao Estudo Técnico-Económico da Criação de Gado Bovino em Angola (A economia da carne). Estudos, Ensaios e Documentos nº 90 – Junta de Investigações do Ultramar. Lisboa. 1962;
- LIMA PEREIRA, J. – A Ovinicultura de lã nas Regiões Tropicais – Tese de Doutoramento – Estudos, Ensaios e Documentos nº 123. Junta de Investigações do Ultramar- Lisboa, 1969;
- PEREIRA, ALEXANDRINO – Forragicultura – Texto de Apoio. Instituto Médio agrário Hoji Ya Henda. Huambo. Angola. 1981;
- SALBANY, A. – Reconhecimento geral preliminar dos tipos de pastos em Angola. Agronomia Angolana, nº 11. 1956;
- UNESCO – Tropical Grazing Land Ecosystems. XVI – Impremerie de la Manutention. Mayene. França. 1979.

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