OBSERVAÇÃO: Texto escrito em Maio de 1996.
1 - INTRODUÇÃO
A escassez de recursos financeiros, a guerra que à décadas assola o território de Cabinda, a degradação dos sistemas produtivos, a desarticulação entre a produção e os circuitos de distribuição e a reduzida oferta de produtos agro-pecuários, exigem uma especial atenção para que se possa assegurar a produção de alimentos e garantir dietas adequadas à população daquela região.
A crescente dependência do desenvolvimento económico de Cabinda em relação ao comportamento do sector petrolífero, conduz à estagnação dos sectores primário e secundário, obrigando o estado a recorrer, cada vez mais, à importação e à ajuda alimentar da comunidade internacional..
Porque o desenvolvimento dos recursos disponíveis localmente tem sido menos importante para governantes e conselheiros dos países dadores e receptores do que a transferência de tecnologia, há a necessidade de alertar, encorajar e apoiar técnicos e políticos de Cabinda para a urgência da criação de sistemas sustentáveis, através da exploração de recursos locais, redução ao mínimo das importações e do recurso ao comércio e tecnologias locais ou regionais.
A integração da pecuária nos diversos sistemas de exploração permitirá uma melhor utilização das terras e aumentos dos rendimentos das culturas, maior segurança alimentar, mais proveitos para as famílias e uma maior contribuição do sector agrícola de Cabinda para o produto interno bruto.
A falta de progresso na pecuária não é só o resultado da carência de meios e recursos técnicos mas também, uma consequência do lento desenvolvimento económico de Cabinda. A produção agrícola de subsistência não estimula a produção pecuária, cujo crescimento será consideravelmente mais lento do que a procura cada vez mais crescente de produtos de origem animal.
A utilização dos parcos recursos financeiros do governo de Cabinda, em projectos pecuários de viabilidade comprovadamente duvidosa, à base de cereais, que Cabinda não produz, conduzirá a uma permanente dependência do exterior e dos circuitos de importação e impede que os organismos do estado cumpram com as suas obrigações na elaboração e execução de um programa de fomento pecuário de Cabinda.
As condições naturais e as potencialidades económicas de Cabinda permitem que, antes do fim do século 20, se possa atingir a auto-suficiência alimentar e se possam exportar os seus excedentes.
2 - DESCRIÇÃO GERAL DE CABINDA (1)
2.1 - SITUAÇÃO. LIMITES
A superfície de Cabinda é de 7 300 km2 e confina a Norte e Nordeste com a República do Congo, a Sul e a Leste com a República do Zaire e a Oeste com o Oceano Atlântico (Fig. 1).
O território encontra-se praticamente enquadrado pelos paralelos 4º 23’ e 5º 46’ de Latitude Sul e pelos meridianos 12º e 13º 6’ de Longitude este de Greenwich.
2.2 - CLIMA
2.2.1 - Temperatura – as temperaturas médias anuais são sempre superiores a 24ºC (Cabinda com 24,7ºC, Lândana com 24,2ºC, Buco Zau com 24,6ºC e Belize com 25,2ºC). Março e Abril são os meses de temperatura média mais elevada (27ºC) e Julho ou Agosto os meses com média mais baixa (21ºC).
2.2.2 - Precipitação – na cidade de Cabinda, a uma altitude de 20 m, o valor médio é de 844 mm, enquanto que em Buco Zau, a 350 m, aquele valor é superior a 1 350 mm. Há duas estações: estação das chuvas (sete meses – Outubro a Maio), com dois máximos, um em Novembro e outro em Abril, separados por um pequeno cacimbo; estação do cacimbo – (quatro meses – Junho a Setembro).
2.2.3 - Humidade – registam-se na cidade de Cabinda valores médios anuais de 86% e em Buco ZAu de 88%, com pequenas amplitudes de variação mensais. De acordo com estes valores todo o território tem clima húmido.
2.2.4 - Vegetação – a maior parte do território de Cabinda é ocupado por floresta densa húmida (Floresta do Maiombe); savanas com arbustos (a segunda formação em extensão); povoamentos arbustivos de matos cerrados; palmares naturais de Elaeis guineensis Jacq. E, agrupamentos de diversas espécies de palmeiras do género Hyphaene.
Embora ocupem áreas relativamente pequenas deve referir-se a existência de mangais, circunscritos ao estuário do Rio Chiloango e às zonas lodosas da lagoa Massabi.
3 - A PECUÁRIA EM CABINDA
A tradição da criação de bovinos é recente, não ultrapassando o efectivo as 500 cabeças. Os bovinos de raça Dahomey pertencem ao sector familiar e concentram-se no Norte e Nordeste, especialmente nas comunas do Luali, sede de Belize, Ganda Cango, Necuto e sede de Buco Zau.
O sector empresarial é representado pela Fazenda Malembo que possui exemplares de várias raças (Zebu, Africander, Brown Swiss, Simmentaler, Santa Gertrudis) e seus cruzamentos.
Os ovinos e caprinos pertencem ao grupo dos anões da África Ocidental (West African Dwarfs) e são explorados pelo sector familiar, no sistema de pastoreio livre. No sector empresarial há um reduzido número de animais adquiridos no Sul de Angola e cruzados com os da região.
Os porcos desta região são de tamanho médio (45 a 50 kg, quando adultos), rústicos e de elevada prolificidade mas pouco precoces e vivem em sistema livre. A exploração de porcos do sector empresarial é débil devido à dependência da importação de cereais.
A maior parte das famílias são detentoras de um reduzido efectivo de galinhas “gentias”, muito vigorosas e rústicas. O crescimento destas aves é lento e atingem em geral, pesos que oscilam entre 0,800 e 1,500 kg. A postura anual é de cerca de 60 ovos com 25 a 35 gramas de peso. O efectivo de galinhas do sector empresarial é muito reduzido por estar dependente da importação de cereais.
O pato comum, cujo peso oscila entre 2,5 – 3 kg nas fêmeas e 3 – 5 kg nos machos, embora de crescimento lento, assume maior importância nas explorações familiares das Comunidades de Floresta e Marginais da Floresta.
3.1 – MINI-PECUÁRIA
A exploraçãp racional de galinhas, patos, gansos, pombos, coelhos, cobaios (Cavia porcellus), tão-da-cana (Thryonomys swinderianus), rato-da-Gâmbia (Cricetomys emini e C. gambianus), caracol gigante (Achatina (Achatina) balteata e Archachatina (Calachatina) marginata) é uma actividade muito prometedora e que deve ser incentivada, por constituir uma importante fonte alimentar e de receitas para as populações das várias comunidades de Cabinda (2).
4 – ASSISTÊNCIA ZOOTÉCNICA E VETERINÁRIA (2)
4.1 - Zonagem pecuária (Fig. 2):
4.1.1 – Zona do Maiombe – devido à presença da mosca tsé-tsé, o sector familiar e empresarial devem explorar, em regime livre, bovinos de raça Dahomey e por vezes seus cruzamentos com N’Dama. Sob certas condições e de preferência em sistema semi-intensivo, o sector empresarial também pode explorar gado N’Dama.
4.1.2 – Zona Marginal da Floresta – o risco de tripanossomose a Sul do Rio Chiloango diminui à medida que se aproxima de Chimbuande, é possível a criação de bovinos da raça N’Dama no sector familiar e empresarial. No sector empresarial, e nas zonas de floresta mais densa, pode também ser explorado o Dahomey (ou outra raça de bovino cornicurto da África Ocidental), o qual, sempre que as condições o permitam, pode ser melhorado por cruzamento com o N’Dama.
A suinicultura e a avicultura familiar e empresarial, em sistema livre ou semi-intensivo, poderão exercer um papel muito importante no abastecimento de carne às cidades de Cacongo e Cabinda.
As diversas lagoas existentes nesta zona poderiam permitir a exploração piscícola, cujo aproveitamento racional pode transformá-la numa importante fonte de proteínas e de receitas para a região.
4.1.3 – Zona fora da Floresta – é a que reúne melhores condições para o desenvolvimento da pecuária no sector empresarial, permitindo inclusive a exploração de raças exóticas, mais produtivas. Devem ser preferidas raças dotadas de certa rusticidade e que resistam bem às altas temperaturas e à elevada humidade.
Nesta zona as pequenas e médias empresas suinícolas e avícolas podem explorar raças mais produtivas se a produção local de cereais atingir níveis que cubram as necessidades da população de Cabinda e em que os excedentes possam, assim, ser utilizados para a alimentação animal.
Nas zonas do Maiombe e Marginal da Floresta, a criação de pequenos ruminantes autóctones ou de outras raças do tipo anão da África Ocidental, bem adaptadas ao Clima, tripanotolerantes e mais resistentes a diversas doenças, deve ser intensificada, quer no sector empresarial como no familiar. Na Zona Fora da Floresta podem ser utilizadas raças melhoradas desde que adaptadas às elevadas temperatura e humidade de Cabinda.
A intensificação da mini-pecuária no sector familiar das três zonas pecuárias, poderá desempenhar igualmente papel de relevo no aumento do consumo de produtos de origem animal e no abastecimento às populações com baixo poder aquisitivo dos bairros periféricos dos principais centros urbanos.
5 – LINHAS MESTRAS PARA O DESENVOLVIMENTO DA PECUÁRIA
A tradição pecuária é recente e, para que seja possível o desenvolvimento pecuário de Cabinda, será necessário desenvolver as seguintes acções (2):
- Criação de dois pequenos centros de pesquisa e fomento pecuário que, considerados como pólos de desenvolvimento, permitirão o desenvolvimento da pecuária de Cabinda;
- Execução de um programa de fomento pecuário que vise o melhor aproveitamento económico das diferentes zonas pecuárias mas que tenha em atenção as condicionantes sócio-culturais e financeiras das populações rurais, que têm normalmente na agro-pecuária a sua actividade principal – e na capacidade técnico-financeira dos criadores do sector empresarial;
- Instalação de um laboratório de diagnóstico que permita prestar informações válidas e seguras sobre a presença e magnitude de determinada doença animal, confirmar o diagnóstico clínico, fornecer os dados necessários à avaliação dos programas de controlo sanitário, elaborar informações sobre a situação epidemiológica, efectuar e orientar os testes necessários à importação e exportação de animais e seus produtos, avaliar no terreno vacinas e medicamentos, etc.;
- Elaboração de programas de profilaxia sanitária contra as principais doenças dos ruminantes e monogástricos existentes no território e que cubram o sector familiar e empresarial;
- Construção de um matadouro local, de preferência junto ao principal centro de consumo, a cidade capital.
6 – CONCLUSÕES
Do acima exposto se conclui que Cabinda tem potencialidades pecuárias naturais que, exploradas racionalmente, permitirão a melhoria do nível de vida das populações que, passa inevitavelmente, pelo aumento do consumo de produtos de origem animal. Para se responder a esta aspiração, que é legítima, é necessário adoptar as melhores e as mais eficazes alternativas, cujas decisões deveriam estar ao alcance dos produtores e comerciantes ou seus representantes, dos investigadores, planificadores e políticos de Cabinda.
BIBLIOGRAFIA
(1) – CASTANHEIRA DINIZ, A. (1973) – Características mesológicas de Angola. MIAA. Nova Lisboa. Angola. pp:: 3-15;
(2) – GOMES, A. F. e MORAS CORDEIRO, J. M. (1991) – A Pecuária em Cabinda. MINADER, Inst. Inv. Veterinária. Huambo, Angola. p: 122;