sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

A importância da mini-pecuária e o consumo de animais silvestres em Cabinda

OBS: Comunicação apresentada ao Congresso Internacional de Medicina Veterinária dos Países em Língua Portuguesa. Praia. Cabo Verde. 1998.


RESUMO

A escassez de recursos necessários para a criação de animais domésticos de grande porte (gado maior) e a alimentação deficiente em proteínas e calorias de origem animal, da maior parte das famílias camponesas do continente Africano, criou e continuará lamentavelmente a criar, um exército de seres humanos que padecem, ciclicamente, de mal nutrição e fome. A procura constante de novas terras e o galopante índice demográfico em África obriga os técnicos à adopção de novos conceitos e novas tecnologias que se adaptem à realidade sócio-económica e cultural dos camponeses de cada uma das regiões do continente Africano. A criação de animais de pequeno porte, junto às residências ou bairros, poderia constituir uma alternativa importante como fonte de alimentos e de rendimentos para as populações rurais de Cabinda.

1 - INTRODUÇÃO

A exploração de pequenos animais, pouco exigentes, muito prolíficos e adaptados às condições ecológicas de Cabinda, é uma actividade muito prometedora e cuja exploração racional poderá constituir uma importante fonte de alimentos e de rendimentos para as populações.
A deficiente oferta e a grande procura de produtos pecuários faz com que estes atinjam preços elevados, tornando difícil a compra desses produtos devido aos baixos rendimentos das populações.
Uma alternativa, relativamente barata, é o consumo de animais silvestres pelas populações urbanas, peri-urbanas e rurais de um grande número de países Africanos. O consumo desses animais assume hoje em dia uma importância que não deve ser negligenciada pois, atinge percentagens superiores ao consumo de carne de animais domésticos.
Em Cabinda, à semelhança do que ocorre nos países vizinhos (Congo, Zaíre e Gabão) e noutros da África Ocidental, uma elevada percentagem da população consome periodicamente várias espécies de animais silvestres que os adquirem nos mercados ou aos caçadores da região. O consumo de carne de cabrito, borrego e porco, nas populações das várias comunidades de Cabinda, é reduzido e só ocorre por ocasião de festas religiosas ou comunitárias.
A colocação em prática de um projecto de assistência técnica e veterinária e a melhoria dos circuitos de comercialização, permitiria aos criadores a obtenção de maiores rendimentos e tornaria mais acessíveis os preços dos produtos de origem animal.

2 – MATERIAL E MÉTODOS

Com base nos critérios adoptados pela Missão dos Inquéritos Agrícolas de Angola (MIAA) em 1967, foram individualizados quatro estratos em Cabinda: Comunidades da Floresta (CF), Comunidades Marginais da Floresta (CMF), Comunidades Fora da Floresta (CFF) e Comunidades Suburbanas (CS).
Com o objectivo de se obter informações sobre a importância da mini-pecuária e do consumo de animais silvestres em cada um dos estratos, foi realizado um inquérito directo, previamente elaborado, procurando-se homogeneizar a amostragem pelos quatro estratos. Os interrogatórios foram feitos separadamente, indivíduo por indivíduo, tomando-se todas as cautelas para se obter informações credíveis.

2.1 – Caracterização das Comunidades de Cabinda

Cabinda, com uma superfície de 7 300 km2, é limitada a Norte e a Nordeste pela República do Congo, a Leste e Sul pela República do Zaíre e a Oeste pelo Oceano Atlântico, estando envolvida pelos paralelos 4º 23’ e 5º 46’ de Latitude Sul e pelos meridianos 12º e 13º e 6’ de Longitude Este (Figura 1).
Com base nas características do território e quadro agro-económico, foi elaborada uma estratificação na qual se baseou o inquérito (1). Os quatro estratos individualizados são em seguida caracterizados.


FIGURA 1 - Estratificação comunitária.


2.1.1 – Comunidades da Floresta (CF)
- Características gerais

Estas comunidades englobam os municípios de Belize e Buco Zau, situados a leste do Rio Inhuca e ocupam uma superfície aproximada de 3 156 km2. A população das CF pertence maioritariamente ao grupo Maiombe. A população rural correspondia, em 1991, a 42,4% da população rural total de Cabinda (1).

2.1.2 – Comunidades marginais da floresta (CMF)
- Características gerais

Englobam a maior parte dos territórios dos municípios de Cacongo e Cabinda, à excepção duma faixa costeira, limitada a Leste por uma linha imaginária que parte de Cacongo, passa por Sassa Zau, Ntó e termina no Iema (Figura 1). Ocupam uma superfície aproximada de 3 300 km2. A população pertence aos grupos étnicos Cacongo e Cabinda. As clareiras existentes na região ocupada por estas comunidades possibilitam a prática de uma agricultura mais diversificada que constitui a ocupação principal destas populações (1).

2.1.3 – Comunidades fora da floresta (CFF)
- Características gerais

Estas comunidades ocupam uma faixa litoral, com altitudes inferiores a 200 m, limitada por uma linha imaginária que une Cacongo ao Iema, na fronteira Sul, depois de passar por Sassa Zau, cortar a estrada que une Lucola a Subantando a cerca de meia distância entre estas duas localidades e de passar por N’. Apresenta uma superfície aproximada de 600 km2 (Figura 1). A população das CFF pertence aos grupos Cacongo e Cabinda e, para além da agricultura, dedicam-se igualmente à pesca para autoconsumo e venda nos mercados de Cacongo e Cabinda. A população da comuna do Malembo, enquadrada nesta região, constitui cerca de 20% do total da população do Município de Cabinda.

2.1.4 – Comunidades suburbanas (CS)
- Características gerais

Estas comunidades ocupam as áreas suburbanas das cidades de Cacongo e Cabinda, localizadas no litoral, abaixo dos 200 m de altitude. A população destas comunidades constitui cerca de 43,3% da população de Cabinda (1) e pertencem aos grupos étnicos Cacongo e Cabinda, embora englobem uma população muito heterogénea, proveniente de outros pontos de Angola e de países vizinhos.

3 – RESULTADOS
3.1 – Objectivos da exploração pecuária

Em todas as comunidades o objectivo principal da criação de aves, pequenos ruminantes e porcos é o auto-consumo, embora os pequenos ruminantes e porcos possam ser também consumidos em dias de festa religiosa ou comunitária (1). A comercialização destes animais ocupa um lugar secundário, mas nas regiões fronteiriças (Congo e Zaíre) e nas localidades atravessadas pelas vias de comunicação (Belize, Buco Zau, Necuto, Dinge e Cacongo) a sua venda assume actualmente uma importância que não deve ser negligenciada.

3.2 – Alimentação da população

A alimentação base das populações de Cabinda é a seguinte:
- Comunidades da floresta – banana-pão, mandioca, espargado, farinha de mandioca, inhame, ginguba, milho, batata.doce;
- Comunidades marginais da floresta – mandioca e banana;
- Comunidades fora da floresta – mandioca, banana, peixe e feijão, sendo normal uma refeição diária de peixe);
. comunidades suburbanas – alimentação muito influenciada pelos produtos importados, embora a mandioca, banana e o inhame ocupem uma posição de relevo.
Em todas as comunidades os animais domésticos de maior consumo são: galinhas, patos, cabritos, borregos e porcos. As espécies selvagens mais consumidas são:
- Comunidades da floresta – porco-espinho, várias espécies de cefalofos, porco-do-mato, macaco, gibóia, rato-da-cana, rato-da-Gâmbia, golungo e por vezes também é consumida carne de elefante da floresta e de pacaça;
- Comunidades marginais da floresta – porco-espinho, cafalofos, macaco, rato-da-cana e porco-do-mato;
- Comunidades fora da floresta – porco-espinho, macaco, cefalofos e rato-da-cana;
- Comunidades suburbanas – consumo das espécies selvagens descritas para as outras comunidades, dependendo da oferta e preços praticados nos mercados (1).

3.3 – Caracterização sumária das espécies exploradas em Cabinda
3.3.1 – Caprinos

Pertencem aos caprinos anões da África Ocidental (West African Dwarfs). Apresentam pelagem variada e de boa conformação. São explorados em sistema livre, sem qualquer intervenção dos seus proprietários.
O interesse pela criação do caprino diminui de Miconje para Cacongo, ocupando nas Comunidades suburbanas maior importância. No Município de Belize, a criação de caprinos, ocupa a seguir aos suínos, o 2º lugar de importância. Nas famílias inquiridas foi encontrada uma média de sete animais por família (valores extremos: 5 e 9).
Segundo a tradição Maiombe, a mulher não pode comer carne de caprino. Nos maiores agregados populacionais essas regras vão sendo ultrapassadas, embora em algumas aldeias, a mulher continue a não comer essa carne (1).

3.3.2 – Ovinos


Pertencem ao grupo dos ovinos anões da África Ocidental (West African Dwarfs). Possuem cauda estreita e cilíndrica e apresentam boa conformação. A pelagem é muito variada, indo do preto, branco e castanho aos malhados de preto e de castanho. Alguns machos apresentam cornos em espiral e crina invertida, enquanto outros não apresentam nem cornos nem crina invertida. Nas fêmeas os cornos estão ausentes. As orelhas são curtas e erectas (1).
São criados em total liberdade ou atados a uma corda nas comunidades marginais da floresta e fora da floresta. Nas famílias inquiridas foi encontrada uma média de seis animais por família (valores extremos: 3 a 9).
O interesse pela sua criação é maior no Norte (Miconje e Buco Zau) do que no Sul (Cacongo e Cabinda).

3.3.3 – Suínos

O suíno desta região é de tamanho médio, com cerdas negras e vive em liberdade nas comunidades da floresta e em cercados nas comunidades marginais da floresta e fora da floresta. É maior o interesse pela criação do suíno no norte (primeira prioridade na criação de animais domésticos) do que no Sul. São alimentados à base de raízes e folhas de mandioca e do que encontram enquanto deambulam à volta das casas, aldeias ou bairros. Nas comunidades suburbanas os proprietários constroem currais rudimentares onde os animais pernoitam.

3.3.4 – Aves
3.3.4.1 – Galinhas

O crescimento destas aves é lento e a corpulência pequena; atingem em geral apenas 1-2 kg. São dotadas de robustez extraordinária e não concorrem com a alimentação humana pois transformam em carne e ovos diversos vegetais, artrópodes, térmites, minhocas, etc. (1).
Todas as famílias possuem algumas galinhas (3 a 10 bicos) exploradas em sistema livre, deambulando ao redor de casas e aldeias e à noite são recolhidas em abrigos rudimentares construídos para as proteger dos predadores (comunidades da floresta e marginais da floresta). Nas comunidades fora da floresta e suburbanas as galinhas são criadas em sistema misto, passando parte do dia em capoeiras construídas para o efeito (1). A criação de galinhas assume maior importância no Sul (CS) do que no Norte (CF).

3.3.4.2 – Patos

O pato comum, embora de crescimento lento, atinge pesos aproximados de 2,5 – 3 kg nas fêmeas e 3 – 3,5 kg nos machos. A sua criação vem assumindo certa importância a nível familiar, justificando maior atenção por parte dos técnicos, pela facilidade de exploração nestas comunidades (1).
São criados em sistema livre, recolhendo à noite para junto das casas dos seus proprietários ou em abrigos rudimentares. Não competem com o homem na alimentação que consomem pois alimentam-se do que encontram enquanto vagueiam.
A criação do pato assume maior importância no Sul (Comunidades Suburbanas) e diminui no norte (Comunidades da Floresta).

3.4 – Caracterização sumária das espécies silvestres consumidas em Cabinda
3.4.1 – Rato-da-cana

O rato-da-cana (rato-dos-caniços, “greater cane rat”, “aulacode”, “rata de cañaveral” é um roedor robusto com 35 a 61 cm de comprimento (exceptuando a cauda, que mede 7 a 25 cm), pertencente à espécie Thryonomys swinderianus (1). Os adultos pesam geralmente 4 a 7 kg, excepcionalmente 9 kg, com rendimento de carcaça de 57,2% (2). Nos países costeiros da África Ocidental a sua carne é igualmente muito apreciada (3, 4).

3.4.2 – Rato-da-Gâmbia

O rato-da-Gâmbia (cricetomo, “nkumbi”) possui maior difusão que o rato-da-cana, mas tem menos aceitação e por isso mais difícil comercialização. A sua carne pode ser conservada fumada ou salgada.
Existem duas espécies: Chicoteemos emiti, que vive sobretudo na floresta, e Chicoteemos gambianus, que frequenta muito a savana e que é a espécie mais conhecida. O animal adulto pode pesar até 1,6 kg (1).

3.4.3 – Caracol gigante

Em Cabinda existem dois géneros de caracóis gigantes comestíveis: o gánero Achatina, aí representado pela espécie Achatina (Achatina) balteata, que também existe noutras províncias do Norte de Angola e o género Archachatina, representado pela espécie Archachatina (Calachatina) marginata que, com excepção de duas pequenas zonas localizadas na região fronteiriça Norte da Lunda Norte, só existe em Cabinda (1, 5). Podem medir até 30 cm de comprimento e pesam em média 500 gramas.

3.4.4 – Macacos

As espécies de símios mais consumidas em Cabinda pertencem à subfamília Cercopithecinae. Normalmente são vendidos inteiros.

3.4.5 – Potamochero ou porco-do-mato (Potamochoerus porcus)

São animais baixos e de formas pesadas, com cabeça maciça muito alongada. A pelagem é avermelhada e o peso do adulto é de cerca de 50 a 55 kg. A longevidade é de 12 – 15 anos. Nas áreas agricultadas danificam muito as lavras. Normalmente são vendidos já esquartejados (1).

3.4.6 – Porco-espinho

Em Cabinda existem duas espécies de porco-espinho: Atherurus africanus e Hystris africaeaustralis. O primeiro, também conhecido por porco-espinho com cauda de pincel ou simplesmente ateruro, existe sobretudo nas florestas primárias, florestas galeria e florestas ripícolas, mas por vezes também próximo de plantações. O seu peso é de 2 – 4 kg, com rendimento de carcaça de 51% (2). Um dos poucos estragos que faz é comer a mandioca colocada nos charcos e fermentar (1).
O H. africaeaustralis é também conhecido por porco-espinho da África do Sul. É o verdadeiro porco-espinho e pesa entre 15 a 27 kg. A longevidade é de 20 anos.

3.4.7 – Golungo (Tragelaphus scriptus)

É também conhecido, embora que indevidamente, por veado. Vive na floresta e galerias florestais dos rios, bem como na savana arbustiva. A altura do garrote varia entre os 70 – 100 cm. Os machos pesam 40 a 80 kg e as fêmeas 25 a 60 kg, com rendimento de carcaça de 60,1% (2). É vendido esquartejado.

3.4.8 – Cefalofos

Os cefalofos englobam os antílopes com estatura pequena ou média (30 – 85 cm), vulgarmente apelidados de bâmbis-de-floresta (sub-género Cephalophus), pertencentes à família Bovidae, (subgénero Cephalophus), pretencentes à família Bovidae, subfamília Cephalophinae. Em Cabinda existem diversas espécies. A longevidade é de 10 – 12 anos.

3.4.9 – Outras espécies

Não se caracterizam: o elefante da floresta (Loxodonta cyclotis), por vezes abatido e aproveitado, mas que escasseia, concentrando-se especialmente nos países vizinhos; a pacaça (Syncerus nanus) e a jibóia (Boa constrictor), grande serpente não vevenosa da família Boidae, consumida pelos Maiombes (1).

4 – Conclusões

O estudo das espécies pecuárias e selvagens consumidas em cada uma das comunidades de Cabinda e a caracterização de cada uma das espécies descritas, permite especular sobre as potencialidades da mini-pecuária e da possibilidade de introduzir a criação de algumas espécies selvagens em cativeiro.
Há espécies domésticas não exploradas, nomeadamente o coelho e o ganso, desconhecidas em Cabinda, não havendo tradição do seu consumo. O coelho é um dos animais que melhor conversão faz dos alimentos e a sua carne é de excelente qualidade. Os gansos, verdadeiros herbívoros, autênticos “grazers”, podem perfeitamente ser explorados sob a forma de bandos em pastagem. A população de Cabinda poderá aceitar outras espécies, pois para além do sabor agradável, o fomento do seu consumo reveste-se de maior êxito quando já existe o hábito de se comer carne de animais de caça.
Embora não tenha sido referido em nenhuma das comunidades de Cabinda, o cobaio (cobaia, porquinho-da-Índia, rato-chino, chino, cávia), Cavia porcellus, é um roedor muito dócil e que pode atingir cerca de 1 kg, é consumido em muitas regiões africanas.

5 – Recomendações

As espécies menores, como todos os animais, têm determinadas exigências de maneio e nutrição que é necessário satisfazer para se obter o máximo de produção.
Não será fácil obter-se resultados imediatos com as espécies tradicionalmente exploradas e a introduzir (6). A maior dificuldade reside na transformação da mentalidade dos técnicos e na vontade política dos dirigentes de um grande número de países africanos. A melhoria das técnicas de maneio e de assistência veterinária dos efectivos já existentes seriam suficientes para duplicar ou triplicar, em algumas espécies, as produções actuais das várias comunidades de Cabinda.
A criação de um centro que actuasse como um centro de estudo e pólo de desenvolvimento e a elaboração de um programa de criação de espécies menores, permitiria um maior apoio à mini-pecuária existente e o estudo das espécies domésticas e selvagens a introduzir em cada uma das regiões de Cabinda. O exemplo e os resultados obtidos por alguns países Africanos – Gana, Benin, Togo, Costa do Marfim e Nigéria – deveriam entusiasmar os técnicos a adoptarem novos conceitos e novas tecnologias de acordo com a realidade sócio-económica e cultural das populações rurais de cada uma das regiões de Cabinda.

AGRADECIMENTOS

O autor agradece à associação das Universidades de Língua Portuguesa (AULP) e à Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (JNICT), o apoio prestado à realização do presente trabalho.

BIBLIOGRAFIA
(1) – GOMES, A. F. e MORAS CORDEIRO, J. M. (1991) – A Pecuária em Cabinda. MINADER. Inst. Inv. Veterinária. Huambo. Angola. 122 p;
(2) – MARTIN, G. H. G. (1985) – Composicion y Palatabilidade de Algunos Animales Silvestres de Uso Corriente como Alimento. Africa Occidental. Rev. Mund. Zootecnia, 53:40-44;
(3) BAPTIST, R. e MENSAH, G. A. (1986) – La Rata de Cañaveral. Animal de Granja del Futuro? Benin y Africa Occidental. Rev. Mund. Zootecnia, 60:2-6;
(4) STIER, C. H.; MENSAH, G. A. e GALL, C. F. (1991) – Elevage d’aulacodes (Thryonomys swuinderianus) pour la production de viande. Rev. Mund. Zoot., 69:44-49;
(5) HODASI, J. K. M. (1984) – Los Caracoles Gigantes de Tierra Comestibles del Africa Occidental. Rev. Mund. Zootecnia, 52:24-28;
(6) HUSS, D. L. (1982) – Especies Menores para las Granjas Pequeñas de América Latina. Rev. Mund. Zootecnia, 43:24-29;

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A FORMAÇÃO DE QUADROS AGRÁRIOS EM ANGOLA

OBS: Comunicação apresentada ao IV Encontro da AULP. 4 A 8 Abril 1994. Lisboa. Portugal.

RESUMO

Uma das tarefas mais importantes e urgentes a ser realizada nos trópicos é aumentar a produção agro-pecuária. É grande a procura de capacitação e aperfeiçoamento em todos os níveis de actividade, desde o campo ao laboratório. Na maior parte dos países em desenvolvimento, a escassez de recursos financeiros e de quadros técnicos capacitados e as dificuldades de transporte, não possibilita a instalação de centros de formação agrária que permitam a formação de quadros agrários. Nos países em que é possível a instalação e funcionamento dos centros de formação profissional, a formação de quadros no ramo agro-pecuário nem sempre atinge os objectivos preconizados porque não se tem em atenção a diversidade geográfica, ecológica, social, económica e cultural de cada região.

INTRODUÇÃO

O desenvolvimento da agricultura é essencial à economia dos países em desenvolvimento porque para além de fornecer alimentos à população, abastece a indústria em produtos primários e interfere na exportação. A agricultura é a principal fonte de formação de capital que contribuirá para o aparecimento dos investimentos necessários ao desenvolvimento da indústria, dos transportes e de outras actividades dos sectores secundário e terciário.
Os diferentes sistemas de produção agro-pecuários, sistemas auxiliares de abastecimento e mercado e graus de eficácia técnico-económica, correspondem à diversidade geográfica, ecológica, social, económica e cultural de Angola, que variam de região para região, de província para província e às vezes, de município para município.
Esta diversidade tem de ser tida em conta na planificação do desenvolvimento agro-pecuário de Angola, ainda que se considere o desenvolvimento como um processo complexo e gradual. A existência de sistemas de produção tão diferentes, como por exemplo, o nomadismo pastoril e a transumância, agricultura de subsistência, comunidades nas primeiras fases de uma economia monetária, explorações agrícolas familiares e unidades modernas de produção intensiva do sector privado, deve ser encarada com muito realismo.
A elaboração de políticas nacionais em matéria económica e social, com o objectivo de: um melhor equilíbrio entre a população crescente e as suas necessidades alimentares; criação de possibilidades de emprego e investimentos em zonas rurais e o aumento de divisas pelo fomento à exportação, deve ser cuidada para se evitar as distorções ocorridas nos últimos anos.
O estabelecimento de um programa de formação agrária a vários níveis não é uma tarefa fácil para um território extenso, como é o caso de Angola. Só o conhecimento exacto da situação actual e a integração de diversos organismos de responsabilidades específicas na busca de objectivos comuns, permitirá que a agro-pecuária assuma o seu real papel na sociedade angolana.

2 – FORMAÇÃO PROFISSIONAL
A transição da economia rural de subsistência para uma economia de mercado constitui a base da transformação do mundo rural e a formação profissional exerce um papel essencial nesse sentido. Sob formas diversas e com a ajuda de diferentes meios que permitam ao agricultor jovem ou adulto adquirir conhecimentos, a formação profissional ensina as técnicas mais recentes de tal forma que ele possa compreendê-las, assimilá-las e pô-las em prática na própria exploração familiar.
A formação profissional rural deve ter como objectivo a formação de pessoas para o desempenho de actividades futuras como agricultores ou trabalhadores especializados. A formação profissional inserida na realidade do mundo rural, com a diversidade local ou regional, dá aos formandos a possibilidade de uma compreensão mais completa da própria colectividade em que estão inseridos.
Através da utilização de técnicas melhoradoras, agrícolas ou não, a formação profissional deve estimular a fixação à vida rural. Ela deve levar os jovens a considerarem a agricultura e as actividades rurais não tanto como uma forma de sobrevivência mas como uma ocupação que, se praticada de forma adequada, pode proporcionar um nível de vida aceitável dentro do padrão nacional.

2.1 – A FORAMAÇÂO DAS MULHERES E DAS JOVENS RURAIS
As mulheres desempenham um papel indispensável nos trabalhos agrícolas e na gestão da economia familiar, em todos os grupos étnicos do ramo Bantu, exige que a formação profissional lhes seja igualmente dirigida. A mulher necessita de receber os instrumentos teóricos e práticos necessários para assumir responsabilidades no desenvolvimento económico e social das sociedades rurais.
A ocupação da mulher nas tarefas diárias e as suas responsabilidades no mundo rural não permite que se desloque para os centros de formação. Nestes casos a formação e a divulgação agrícola deve ser realizada por meio de curtas acções de formação, reuniões e visitas dos formadores e vulgarizadores aos locais de residência. Este tipo de formação tem custos que as dificuldades económicas dos países em desenvolvimento não permitem suportar, relegando para segundo plano a formação das mulheres.
As mulheres e as jovens rurais devem encontrar nos programas de formação profissional as mais variadas matérias. Para que tais objectivos sejam alcançados é necessário realizar trabalhos de pesquisa para determinar os conteúdos de tais programas e a sua aplicação de acordo com a realidade sócio-económica e cultural do mundo rural de uma determinada região. Tais trabalhos são até agora demasiado incompletos ou inexistentes para constituírem as bases dos programas de formação sistemática.

3 – FORMAÇÃO DE QUADROS MÉDIOS

À semelhança do que ocorre em muitos países em desenvolvimento, em Angola há uma tendência crescente da capacidade técnica estar acima do que na realidade faz falta para o desempenho de muitas tarefas básicas e, por conseguinte, a inclinar-se demasiado para o lado teórico. O ensino eminentemente teórico produz, inevitavelmente, um “desnível cultural” indesejável entre o camponês ou criador de gado, ávidos de receber ensinamentos práticos, para a resolução dos seus problemas diários, e o técnico incapaz de os satisfazer.
A actual formação dos Técnicos Médios do ramo agro-pecuário peca por desconhecer:
- a estrutura social e económica das colectividades agro-pecuárias – a base sociológica da produção agro-pecuária só pode ser ensinada por pessoal dotado de conhecimentos profundos sobre as populações das zonas onde trabalharão os quadros formados. O êxito ou o fracasso dos programas de produção agro-pecuária dependerá do grau de compreensão que exista entre o técnico e o proprietário;
- edafologia e agronomia – o ecossistema deve ser analisado duma forma integrada – relação solo-planta-animal, permitindo a interpretação de factores como clima, solos, pastos, criação de gado, nutrição animal e agentes patogénicos nas distintas regiões do país;
- técnicas de produção animal e vegetal – é fundamental conhecer os métodos de exploração tradicionais e as técnicas de produção mais complexas aplicáveis sobre uma base económica mais realista.

4 – CONCLUSÕES
Há a necessidade de se redefinir a estrutura dos cursos agrários para que os técnicos possam, também, responder com urgência aos problemas que lhes são colocados por sistemas tradicionais de produção das várias regiões de Angola.
É urgente a concepção de um sistema mais dinâmico de capacitação e ensino no ramo agrário, que satisfaça as necessidades de cada região e a elaboração de uma estratégia do quadro profissional suficientemente flexível para que possa adaptar-se à evolução contínua da realidade agrária.
É evidente que as dificuldades de planificação das estruturas dos cursos agrários são enormes, principalmente quando o conhecimento real e actual dos sistemas de produção é reduzido ou nulo.

Agradecimentos
O autor agradece à Associação das Universidades de Língua Portuguesa (AULP) e à Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (JNICT) de Portugal o apoio prestado à realização do presente trabalho.